Como fazemos de tempos em tempos, fui à casa de campo de meu irmão para o almoço de domingo. E como fazemos sempre, rolou uma boa caipirinha de limão, compartilhada entre eu e minha cunhada. Os “bêbados” de plantão, como brincam aqueles que ficam só na cervejinha.
Quando anunciei o repeteco já me advertiam sobre a parte do bêbado que não tinha dono e que se eu caísse com certeza a Menina, a basset hound da casa lamberia minha boca como qualquer cachorro ao ver um bêbado na calçada.
Entre uma piada e outra, um gole e outro, notei como a cadelinha me olhava fixamente. Sou apaixonado por cachorros e comecei a achar que ela estava apaixonada por mim. Resolvi parar na segunda dose.
Almoço, sobremesa, café. Depois da sesta na rede, sabendo de meu interesse por móveis e peças antigas, meu irmão me oferece uma cadeira que estava jogada no porão. Bati o olho e dei uma gargalhada: a semelhança era absurda.
Cadela e cadeira. Cara de uma, focinho da outra.
Aquelas perninhas curtas e tortas tinham muito estilo: o inconfundível Luiz XV. Antes de sair tirei umas fotos da família para disfarçar e foquei no olhar da Menina.
Vários domingos depois volto com minha metamorfose. A madeira lixada e pintada com laca grafite, o estofado forrado na cor laranja e a Menina estampada no espaldar. Um sucesso!
Só tinham olhos para elas: cadeira e cadela. E, claro, nada de caipirinha!
O domingo a 40 graus (alcoólicos) foi substituído por um chá de cadeira.
Décio Navarro, designer de interiores e colunista Arquitecasa